quarta-feira, 26 de agosto de 2015

LA FAMILLE BÉLIER (2014) de Eric Lartigau



 Tenho de admitir que as minhas expetativas não eram particularmente positivas em relação a La Famille Bélier. Depois de ser exposto aos trailers do filme e ter até lido algumas coisas sobre o filme, parecia-me que apenas me esperava mais um filme forçosamente inspirador, cliché e irremediavelmente sentimental. Estes não são os melhores pensamentos para se ter quando se vê um filme pela primeira vez, mas admito que nem as minhas baixas expetativas eram suficientemente baixas para o filme que tive de aguentar durante 104 minutos.

  Primeiro há que falar um pouco da narrativa do filme, proveniente de um texto que, não me perguntem como, precisou de quatro diferentes argumentistas para ser escrito. Paula (Louane Emera) é uma jovem adolescente a viver numa comunidade rural em França, sendo que a jovem é a única pessoa na sua unidade familiar que consegue ouvir, sendo os seus pais, Gigi (Karine Viard) e Rodolphe (François Damiens), e o seu irmão mais novo, Quentin (Luca Gelberg, surdos. Os pais, em particular, parecem completamente dependentes da filha para agir como tradutora e intérprete.

 Apesar de a sua família ser incapaz de apreciar esse seu talento, Paula tem uma bela voz de canto que é descoberta numa aula de coro em que a protagonista se tinha inscrito para se aproximar do rapaz pelo qual nutre uma inocente paixoneta de adolescente. Oportunidades são reveladas e Paula tem de escolher entre ir estudar canto para Paris ou permanecer com a sua família que tanto parece depender da sua audição. Não sei se seria um spoiler revelar o final, mas o filme é tão básico e cliché que penso que já deve ser bastante claro como o filme termina. Um final lamechas e inspirador, tudo acaba bem, e a audiência deve sair do cinema com umas lágrimas nos olhos e umas horas bem passadas numa comédia francesa.

  O que eu pensava tratar-se de um filme com propósitos inspiradores e de promover as ideias de igualdade etc., devido à publicidade e textos sobre o filme, acaba por ser apenas uma pobre tentativa de capitalizar a popularidade da jovem protagonista, uma antiga concorrente do The Voice francês. Sendo assim, é um pouco injusto olhar o filme e examinar e criticar a sua representação de uma família maioritariamente surda, visto que o filme não parece fazer tenções de representar a comunidade em geral, mas é difícil fazer evitar tal julgamento quando confrontado com o filme.

 O facto da família de Paula ser surda é apenas um dispositivo narrativo para salientar quão especial e diferente o bonito floco-de-neve que é a nossa protagonista tão talentosa, e ao mesmo tempo injetar humor no filme. Humor que consegue, apesar do seu tom leve, ser incrivelmente desconfortável de observar. Os pais, em particular, são reduzidos a duas caricaturas ridículas cuja surdez é uma constante fonte de gozo. Quer seja numa cena em que a filha tem de traduzir os conselhos de um médico em relação aos fungos genitais da mãe, a outra cena em que, devido à sua surdez, os dois têm sexo enquanto uma das amigas da filha está em casa e fazem um barulho imenso que se consegue ouvir por toda a parte.

 Mas não é só a sua surdez que é tornada numa pobre piada. As duas figuras paternais comportam-se mais como adolescentes petulantes do que como adultos responsáveis. A mãe, em particular, nas mãos de Karine Viard é um cartoon em forma humana, como se a atriz tivesse olhado os Loony Toones e decidido que iria imitar as personagens que via, exagerando ainda mais o seu comportamento. O único momento em que a atriz se assemelha a uma presença minimamente plausível ou mesmo suportável, é uma cena marcadamente dramática e até um pouco cruel, cuja carga emocional nunca parece ser completamente justificada pelo resto do filme.

 Muito disto seria perdoado se o filme tivesse alguma piada, mas tentar encontrar comédia neste filme é equivalente à procura de um glaciar no meio de um deserto africano. O filme depende muitas vezes de humor crasso e pueril que, para além de estar pejado de clichés e fórmulas cansativas, é mais desconfortável e ofensivo na sua estupidez que verdadeiramente divertido. Eu sei que o humor é algo particularmente subjetivo e que alguém talvez encontre neste filme o píncaro da comédia cinematográfica, mas, para mim, acho plausível afirmar que já consegui encontrar mais divertimento nos dramas de Ingmar Bergman.

 Em termos de realização e estilo, o filme é praticamente não-existente. Qualquer pessoa podia tê-lo realizado, sendo que o filme caminha o difícil caminho entre a absoluta banalidade medíocre e a incompetência técnica, sendo que a montagem do filme é particularmente desastrosa.

 O elenco de modo geral é incrivelmente medíocre, sendo que apenas Luca Gelberg e Roxane Duran, como o irmão e melhor amiga da protagonista, é que despertaram em mim qualquer sombra de aprovação ou positivismo. Apesar de ter ganho o César para Revelação Feminina do ano passado, Louane Emera apenas mostra um mínimo de carisma e competência, parecendo mais apropriada a um papel em um filme televisivo do Disney Chanel que a uma das mais altas honras do cinema francês.

 O filme é uma experiência sem nada para oferecer, um star vehicle sem grande estrela no seu centro. O humor é inconsequente ou, por vezes, ativamente ofensivo e desconfortável. Mas, mais que toda essa coleção de mediocridade e incompetência, o filme é incrivelmente aborrecido. É um filme mau, mas a sua falta de ambição e completo apoio em clichés baratos faz dele uma experiência abismal, nem chega a ser tão mau que é bom, é apenas um triste exemplo de mediocridade cinemática.

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