domingo, 31 de janeiro de 2016

SPOTLIGHT (2015) de Tom McCarthy


Spotlight


Filmes que se focam em histórias verídicas sobre investigações jornalísticas, ou outros tipos de cruzadas morais, têm tendência a se focarem em demasia nos mecanismos do processo de investigação e se tornarem num encadeamento de acontecimentos e factos clinicamente apresentados. Acrescente-se a isto o facto de que estamos a falar de um projeto feito com uma clara pátina de prestígio e respeitabilidade pronta para a Awards Season, e O Caso Spotlight tinha todos os ingredientes para ser um dos mais enfadonhos e medíocres filmes de 2015. Felizmente, a liderar todo o edifício deste filme está Tom McCarthy, um realizador que, excetuando o desastroso The Cobbler, sempre demonstrou um fenomenal talento para a apresentação de histórias humanas recheadas de delicadas e minuciosas caracterizações. Como consequência, Spotlight é, na verdade, uma das incontornáveis joias no panorama do cinema de prestígio do ano passado e um dos melhores candidatos a chegar ao triunfo na futura noite dos Óscares.

Spotlight retrata uma célebre investigação levada a cabo em 2001 pela equipa Spotlight do Boston Globe sobre a horrenda e sistemática ocorrência de abusos sexuais de menores por membros do clérigo, cuja culpabilidade era subsequentemente oculta pelos mecanismos internos da Igreja Católica. Seguindo a tradição de incontáveis outras histórias ditas inspiradoras que se tornam favoritos na corrida aos mais importantes prémios de Hollywood, Spotlight relata assim uma narrativa verídica que, de momento, não contém em si grandes controvérsias ou problemáticas morais, sendo que é indiscutível o heroísmo dos investigadores e a importância e legitimidade ética da sua exposição deste caso. Mesmo assim, aceitando que não há grande problematização ideológica no cerne deste filme é justo apontar quão genial é a eficácia do guião sobre o qual todo o filme foi desenvolvido.




Escrito por Tom McCarthy e Josh Singer, o argumento de Spotlight é uma magistral criação de equilíbrio tonal e de sublime balanço humano, emocional e factual. Nunca tendo sombra de dúvida da estarem no lado certo da justiça em relação a esta narrativa, os dois autores tecem uma teia de brilhantes personagens baseadas em contrapartes reais, e vão oferecendo pequenas doses de informação pessoal sem caírem em demasiada exposição. As cenas de exposição são, aliás, nunca oferecidas como caracterização declarada mas como veículos de criarem um retrato de enganadora modéstia sobre uma comunidade, uma cidade apoiada na sua identidade religiosa. Para além do mais, o modo como as relações de poder económico e moral vão sendo delicadamente reveladas, incluindo algumas verdades abrasivas sobre a realidade longe de ser perfeita da instituição do Boston Globe, dá um toque de bem-vinda complexidade a um filme que ameaça sempre tornar-se uma elegia inapropriadamente celebrativa dos seus heróis centrais.

No entanto, apesar dessa ameaça, um dos melhores aspetos de Spotlight é precisamente o modo como evita alguma vez se converter numa simplista narrativa do herói individual, negando a qualquer uma das suas personagens o patamar dramático de protagonista, ao invés criando uma narrativa completamente apoiada numa omnipresente ideia de coletividade humana. Nesse aspeto, Spotlight recordou-me um dos meus filmes prediletos de 2014, Pride, outro maravilhoso exemplo de um guião que oferece uma perspetiva intrinsecamente humana de uma narrativa inspiradora do passado, ao fugir aos usuais clichés de individualismo forçado a que recorrem tantos filmes semelhantes.




Este tipo de retrato coletivo depende de modo monumental do trabalho dos seus atores e o elenco de Spotlight não desaponta. Dirigidos pela mão segura de Tom McCarthy, os intérpretes deste filme são uma coleção de algumas das prestações mais modestamente consumadas de todo o ano, nunca puxando para si a atenção do público de modo pernicioso para a abordagem geral da obra. Liev Schreiber nunca esteve melhor, demonstrando de modo maravilhosamente subtil a condição de constante outsider da sua personagem sem nunca perder um tom de inequívoca autoridade. Stanley Tucci representa de modo soberbo um homem que carrega sobre as suas costas o peso de anos a testemunhar uma inalterável injustiça institucional apoiada no horror do sofrimento de inocentes crianças. Rachel McAdams é o píncaro do que deve ser um ator secundário, sendo um constante suporte da audiência nas suas reações e modo como telegrafa o seu processo de informação. Poucas vezes um ator demonstrou tão bem o que é “ouvir”. Michael Keaton poucas vezes esteve melhor que aqui quase que superando a sua explosiva prestação em Birdman com uma alternativa bastante mais discreta neste filme. Enfim, todos os atores deste imenso elenco são maravilhosos e tenho pena de não ter a capacidade ou mesmo paciência de descrever detalhadamente o trabalho individual de cada um.

Há, no entanto, duas instâncias que tenho de destacar pela positiva e pela negativa, Todos os atores que interpretam as vítimas já adultas do abuso sexual por parte dos oficiais da igreja, são espetaculares, oferecendo variadas visões de um sobrevivente deste tipo de trauma aquando dos seus anos formativos. Michael Cyril Creighton e destes atores quem mais se destaca e eu diria mesmo que a sua prestação é mais admirável de todo o filme, expondo perfeitamente as mágoas da sua personagem, sem nunca exacerbar a emoção do seu relato ou sacrificar a dignidade do indivíduo que está a interpretar. Mark Ruffalo é a outra figura de destaque, mas neste caso é pela negativa. Ao contrário do resto do elenco, Ruffalo apresenta um trabalho gritado e cheio de furiosa indignação sem sombra de modulação, oferecendo um apoio moral para um público horrorizado pelas informações do filme mas prejudicando a abordagem de modesto naturalismo que tanto caracteriza Spotlight enquanto uma obra cinematográfica. Basicamente, enquanto todos os outros atores fogem ao lado mais vistoso e melodramático deste tipo de filme inspirador de prestígio, Ruffalo cai por completo nesses mesmos clichés para detrimento do seu trabalho e da geral qualidade do filme.




Por muito que o argumento e o elenco sejam maioritariamente geniais, o filme não seria o sucesso que é sem a concretização formal possibilitada por McCarthy e a sua equipa. Nunca tendo sido um realizador com um estilo particularmente distinto ou visível, não é de admirar quão modesta é a formalidade de Spotlight, mas para este tipo de narrativa jornalística há algo de perfeitamente essencial na apresentação direta e simples das histórias humanas. Mesmo assim é de louvar o modo como o realizador evita deixar o seu filme com a aparência de um telefilme, ao criar uma mise-en-scène fortemente apoiada em visões de coletivos humanos a partir de planos gerais e eficientes composições de atores no frame.

Também de admirar é a formidável montagem que fazem deste filme de mais de duas horas uma das obras mais velozes do cinema de prestígio de 2015, nunca desperdiçando um momento que não seja essencial para a sua tese final, quer seja em termos de informação factual ou momentos de delicada caracterização, como alguns fugazes momentos entre membros da equipa de investigação e as suas famílias. De igual modo, há algo de perfeitamente eficaz mas nunca vistoso na banda-sonora de Howard Shore, que lembra as simples composições que caracterizavam dramas semelhantes durante a década de 70. De ainda maior destaque está, surpreendentemente, o seu design que reproduz com sublime exatidão a Boston de 2001 com uma infinidade de pequenos detalhes aplicados tanto ao nível da cenografia como dos figurinos.



Em resumo, a linha que Spotlight balança entre frieza clínica na sua observação de um processo de investigação jornalística e o seu lado humano, permitem a este filme ser uma das mais eficazes e belissimamente concretizadas obras de cinema de prestígio de 2015. É um filme sobre um coletivo de pessoas e sobre uma causa, mas é sagaz o suficiente para retratar cuidadosamente cada um dos seus intervenientes, nunca vilificando ou simplificando as pessoas envolvidas na narrativa, quer do lado dos investigadores, das vítimas, da instituição religiosa ou mesmo dos agressores. Um triunfo modesto e limitado pela sua respeitabilidade própria do cinema de estúdio atual, mas não por isso menos louvável.


sábado, 30 de janeiro de 2016

THE BIG SHORT (2015) de Adam McKay




Depois da sua vitória nos Producers Guild Awards, parece que The Big Short, A Queda de Wall Street, é um dos incontornáveis favoritos para o tão desejado Óscar de Melhor Filme. A corrida aos prémios da Academia este ano tem sido marcada por uma constante incerteza e uma panóplia de surpresas, pelo que eu me estou a agarrar desesperadamente à esperança que este filme acabe por sair do Dolby Theatre derrotado, nem que seja apenas nessa categoria. Estou bem ciente que os Óscares não são, nem nunca foram, um bom barómetro de qualidade artística, mas, mesmo assim, é difícil encontrar um filme mais desleixadamente concretizado que The Big Short nesta presente Awards Season.

Em termos formais, o filme é uma obra de crónica indisciplina e franca incompetência técnica. A fotografia é prosaica no melhor dos momentos e ativamente incompetente nos piores, focando-se na cara dos atores e em composições banais que quase dão a impressão de estarmos a ver um telefilme da ABC com noções de desproporcional importância própria. Isto não é ajudado pela montagem enlouquecida em que o conceito de continuidade, lógica espacial e ritmo dramático são conceitos obscuros e nunca aplicados. Sinceramente, não percebo o amor pela montagem deste filme, a não ser que as pessoas estejam a confundir a palavra melhor com a palavra mais, pois este é, sem dúvida, um dos filmes mais conspicuamente editados dos últimos tempos, chamando a atenção do público para cada um dos seus hiperbólicos cortes que pouco fazem senão distrair e demonstrar um desenfreado desespero da parte dos cineastas em injetar energia num filme que se afoga na sua constante necessidade de expor informação a partir de longos monólogos.




As intenções dos filmes são francamente nobres ou pelo menos louváveis, mas a sua execução e, acima de tudo, a sua jocosa abordagem nunca me deixaram particularmente confortável com a experiência na sua generalidade. Porque é que se há que insistir tanto num registo de irónica paródia e constante exacerbação de uma despreocupação ao estilo dos mais irritantes aspetos da atual bro culture? Talvez seja melhor falar um pouco de qual é o sujeito do filme antes de prosseguir na minha listagem de defeitos e fragilidades.

The Big Short apresenta-se como uma exposição da catástrofe que foi o despoletar da crise económica em 2008, oferecendo às suas audiências um lugar de primeira fila para o cataclismo ao acompanhar alguns dos poucos homens que se aperceberam do desastre iminente e conseguiram lucrar a partir do cataclismo financeiro. O filme também se apresenta como uma explicação acessível e divertida, ao estilo de programas como o Daily Show ou o Last Week Tonight, da complicada realidade dos jogos monetários de Wall Street, sendo que, infelizmente, é impossível olhar o produto final sem observar ora uma colossal condescendência dos cineastas para com a sua audiência ora uma estranha e desconfortável atitude de leviano desprezo para com a importância e seriedade das suas informações que tanto tenta transmitir a partir de joviais e desnecessários truques cinematográficos.




Um recorrente mecanismo utilizado para supostamente facilitar a assimilação de informação por parte da audiência é o uso de celebridades a interpretarem-se a si mesmas e a falarem diretamente para a câmara. Sei que há quem vá achar isto engraçado, mas para mim pareceu-me sempre uma declaração de como os cineastas não têm uma ponta de confiança na capacidade do seu público para se manterem interessados numa narrativa de importantes aspetos sociais e económicos sem serem distraídos com a visão de Margot Robbie numa banheira a vomitar uma torrente de informação que a própria atriz não parece ter bem a noção do que significa. O único destes momentos que realmente tem esperança de funcionar envolve um casino e Selena Gomez e apenas resulta devido ao modo como os cineastas realmente parecem estar a usar o cenário hedonístico como parte essencial da explicação e não como apenas mero entretenimento barato para um público com uma atenção aparentemente equivalente à de uma criança hiperativa de 4 anos.

Este é um filme que está constantemente a implorar à audiência que preste atenção à sua vistosa forma, mas infelizmente, essa mesma forma é um desastre de indisciplina estilística e o elenco certamente não ajuda em toda esta construção de sardónico humor e sátira que não contém em si uma ponta da sofisticação que os cineastas pensam ter alcançado. Não que os atores ofereçam aqui desastrosas prestações, longe disso. O elenco, maioritariamente masculino, é recheado de nomes sonantes e todos os atores estão perfeitamente empenhados em traduzir a abordagem estilística do filme no seu trabalho de personagem. O efeito final está, no entanto mais próximo de um sketch do SNL convertido num filme do que numa obra de consistente relevância humana. Basicamente não há aqui seres humanos credíveis, mas sim uma coleção de coloridas e vácuas caricaturas que são, surpreendentemente, todas baseadas em pessoas reais que eu não acredito serem tão ridículas e desumanas na sua apresentação como os palhaços que vemos em cena neste filme.




Dois atores, no entanto, são de destaque. Steve Carrell está limitado pela atitude de constante indignação da sua personagem, mas é fascinante ver o ator investir tanta da sua característica energia no que é basicamente uma caricatura em constante gritaria de sermões enraivecidos contra as loucuras e injustiças de um sistema corrupto. Talvez apenas apreciado este trabalho porque foi com a sua fúria omnipresente que eu mais me identifiquei, mas o trabalho de Carrell foi certamente, para mim, um dos pontos mais fortes do filme. Num registo diametralmente oposto temos Christian Bale, que recebeu uma nomeação ao Óscar de Melhor Ator Secundário pela sua prestação como o primeiro homem a aperceber-se do desastre iminente resultante da selvagem manipulação financeira e corrupção do mercado imobiliário. A sua personagem é a única que parece ser um ser humano minimamente credível e não apenas uma caricatura bidimensional, sem sacrificar uma certa excentricidade necessária para o filme não descarrilar do seu tom quando se foca nele. Infelizmente, os esforços de Bale têm a tendência a cair na mesma indisciplina estilística do restante filme e a dependência em tiques e vistosas manias é uma grande fonte de desnecessárias distrações. Mesmo assim há que louvar estes dois atores e os seus esforços que quase conseguem elevar The Big Short a um patamar levemente acima da mediocridade que tanto o caracteriza.

Para mim, o maior problema de todo este filme nem é a sua incompetência formal ou a sua desumana coleção de caracterizações limitadas, mas sim o seu tom, que já anteriormente referi. Ao investir num constante registo de insinceridade, The Big Short, que já é um projeto de premissas dúbias quando celebra o sucesso financeiro de um grupo de homens que se aproveitou da iminente miséria de milhões de pessoas para ganhar milhões, acaba por ser o arquiteto da sua própria irrelevância. O filme pretende explorar a doentia realidade e o perigo de um sistema capitalista caído em completa selvajaria gananciosa, e estas são ideias importantes para transmitir a uma audiência, mas eu não penso que reduzir tudo a uma comédia irónica e despreocupada seja a chave para tal, especialmente quando o tom do filme apenas parece retirar importância à informação que nos vai sendo dada.



No final, para ver um filme sobre a recessão atual e sobre as maquinações económicas que levaram a tal eu prefiro ver Inside Job, um documentário imensamente mais informativo e colossalmente mais sofisticado como uma obra cinematográfica, ou mesmo Margin Call, cujos epítetos trágicos conferem uma atmosfera apropriadamente operática ao desastre que pretende examinar. Não quero com isto afirmar que seja impossível criar uma comédia eficaz sobre a crise que despoletou em 2008, mas The Big Short não é esse filme, independentemente dos Óscares que talvez acabe por injustamente ganhar. 


sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

BROOKLYN (2015) de John Crowley




Quando em 2007, Expiação estreou, trouxe consigo o que parecia ser uma preciosa descoberta de um novo e jovem prodígio, a atriz Saoirse Ronan. Então com somente 12 anos, a atriz recebeu aclamação internacional pelo seu formidável trabalho e até chegou mesmo a arrecadar uma indicação ao Óscar de Melhor Atriz Secundária. Depois dessa estrondosa entrada no panorama do cinema mundial, Ronan, infelizmente, pareceu andar um pouco perdida durante vários anos. As suas tentativas de recapturar o sucesso e respeitabilidade luminosa de Expiação pareciam sempre cair em desastre ou na ignorância do público e os seus melhores trabalhos constantemente acabavam por ser esquecidos ou injustamente ignorados. Em 2015, a promessa de génio que o drama de guerra de John Wright fez finalmente pareceu pagar dividendos e Saoirse Ronan é uma das principais candidatas ao Óscar de Melhor Atriz pela sua prestação num filme que não poderia ser mais um glorioso star vehicle ao estilo dos mais deliciosos women’s pictures da Hollywood de outrora, Brooklyn de John Crowley.

Ronan é um poço de carisma ao estilo da velha Hollywood, sendo que o seu trabalho funciona perfeitamente na sua modulação de emoções fortes e simples telegrafadas de modo claro mas belissimamente delicado. Aliás, toda a prestação da atriz é caracterizada por uma formidável delicadeza mesclada com uma estilização de maneirismos apropriados à localização histórica da narrativa. Uma mistura da simplicidade apelativa dos clássicos da velha Hollywood com a subtileza expressiva de estilos mais atuais, esta é uma performance de louvar que, infelizmente, é bastante limitada por algumas das imposições do texto.




Já explorei a performance da atriz principal, mas ainda nem sequer nomeei a personagem sob a sua responsabilidade. O filme desenvolve-se à volta de Eilis, uma jovem rapariga irlandesa que, em 1952, imigra da Irlanda para Nova Iorque e começa uma nova vida em Brooklyn, longe da miséria de uma nação a viver sob a sombra do pós-guerra. Na sua nova nação, vemos a protagonista desabrochar especialmente quando inicia uma relação romântica com Tony (Emory Cohen), um jovem italo-americano com especial afeição por raparigas irlandesas. A partir daí, o filme torna-se num dos mais deliciosos romances do ano, transpirando romantismo tingido com a doçura da mais rarefeita nostalgia cinematográfica dos últimos tempos. No entanto, uma inesperada tragédia familiar leva a protagonista a voltar à Irlanda, no que começa por ser uma estadia decididamente temporária, mas que vai ameaçando tornar-se permanente. Brooklyn acaba por cair num triângulo amoroso ao incluir Jim (Domhnall Gleeson), sem, no entanto, alguma vez perder o seu foco na experiência de uma jovem emigrante, apesar de uma estranha falta de autonomia da sua parte.

Uma das mais significantes fragilidades do filme é, aliás, o modo como nunca permite que as decisões da sua protagonista sejam expressas de modo orgânico, estando sempre a forçar mecanismos narrativos para avançar mais facilmente o enredo. Não sei se isso é uma consequência do livro de Nick Hornby, ou se é um fruto da sua adaptação, mas o facto é que este elemento se revela como um os maiores problemas de Brooklyn enquanto filme.




Em termos estilísticos o filme deve muito às convenções do cinema clássico americano, sendo quase uma homenagem tal é a sua dependência de mecanismos meio antiquados. Há algo de charmoso no seu tradicionalismo, especialmente em momentos como uma melancólica noite de Natal. A recriação dos ambientes de época acompanhados pela música romântica e a fotografia atraente são imensamente apelativas quando bem utilizadas, sendo que os figurinos de Odile Dicks-Mireauz também são de destaque, nomeadamente no seu uso de cor para marcar a evolução da protagonista e na sua composição dos ambientes urbanos da Nova Iorque da época.

O filme, para ser honesto, triunfa na secção passada em Nova Iorque, quando o seu uso de nostalgia cinematográfica se converte como que numa doce exteriorização do isolamento e evolução emocional da sua protagonista. Nas secções do filme passadas na Irlanda, esses mesmos estilos parecem deixar de ser uma eficiente homenagem aos classicismos de uma Hollywood de outros tempos e apenas aparentam converter-se numa desajeitada reciclagem de mecanismos narrativos e cinematográficos que não parecem estar completamente dominados pelos cineastas aqui em ação.




Isto não impede o filme de ser uma obra de delicioso romantismo, mas, juntamente com algumas das suas limitações textuais, decerto que impede Brooklyn de ser o absoluto triunfo de convencionalismo bem aplicado que poderia ter sido. A ajudar o seu relativo sucesso está, há que apontar, o seu formidável elenco que não se reduz simplesmente à sua luminosa protagonista.

Uma das grandes injustiças nas nomeações dos SAG deste ano foi, pelo menos para mim, a  falta de menção deste filme, tendo em conta a estonteante riqueza da sua coleção de atores. Até as mais pequenas personagens são concretizadas com admirável vivência e colorida expressividade, desde uma inspiradora companheira de viagem de Eilis, passando por todo o elenco irlandês, e culminando nos ambientes nova-iorquino povoados de personagens que são tão bem apresentadas e concretizadas que poderiam ter filmes focados nelas mesmas.




De todo o elenco, contando com Ronan, há uma figura de incontornável destaque. Falo de Emory Cohen como o principal interesse romântico do filme, Tony. Os trabalhos passados do ator nunca me deixaram com uma impressão particularmente positiva dos seus talentos, mas em Brooklyn, a sua prestação é perfeitamente miraculosa. Poucas vezes vi uma personalidade introvertida ser exposta com tanta mestria e humanidade, nunca descurando, no entanto, o encantador charme necessário para fazer o enredo romântico funcionar como principal força propulsora de grande parte da narrativa de Brooklyn. As cenas partilhadas entre Cohen e Ronan são aliás os mais deliciosos momentos do filme, brilhando com a qualidade de estrela de ambos os atores e transpirando de um tipo de romance clássico que poucas vezes se encontra no cinema atual concretizado com tal sinceridade.


No final, Brooklyn é um filme que está longe de ser perfeito e que tem na sua maior qualidade também o seu maior defeito, sendo que o filme encontra glória no seu tradicionalismo na mesma medida que acaba por cair num registo tristemente prosaico quando parece poder alcançar verdadeiras maravilhas se arriscasse um pouco e não se limitasse tanto. No entanto, para os grandes fãs dos romances clássicos de Hollywood, esta é uma obra essencial e deliciosa. Visto que eu sou precisamente um fã desse tipo de cinema, há que admitir que me deixei apaixonar completamente pelos charmes deste simples filme, por muito que reconheça as suas fragilidades.´



quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

THE REVENANT (2015) de Alejandro González Iñarritu

Peço, desde já, desculpa pela minha ausência deste blog e pela extensa dimensão deste texto. No entanto, depois de todo o amor que este filme tem recebido e da triunfante celebração do filme pela Academia de Hollywood nas suas nomeações, eu achei necessária oferecer uma pormenorizada justificação da minha animosidade para com o filme mais recente de Alejandro González Iñarritu, The Revenant – O Renascido.


The Revenant


Depois de uma noite de inequívoco triunfo nos Golden Globes e uma estonteante coleção de 12 nomeações para os Óscares da Academia, The Revenant – O Renascido tem-se vindo provar como um dos incontornáveis favoritos da Awards Season. É claro que, convém esclarecer, por muito que se fale da sua formidável técnica ou dos esforços do seu realizador, a mais importante narrativa associada ao filme nesta temporada dos prémios de cinema centra-se em volta do seu ator principal, Leonardo DiCaprio. Depois de 4 nomeações que não resultaram em nenhum galardão e uma estranhíssima obsessão da internet para com a sua aparente condição como um dos grandes injustiçados dos Óscares contemporâneos, parece que é com este filme que DiCaprio irá finalmente arrecadar o tão desejado prémio para Melhor Ator. Percebo, obviamente, toda esta obsessão com o reconhecimento máximo ao trabalho de um dos mais populares atores de Hollywood, mas, para mim, este filme nunca foi o projeto de Leonardo DiCaprio, mas sim um filme do seu autor, o mexicano Alejandro González Iñarritu, e do seu diretor de fotografia, Emmanuel Lubezki.

A minha relação com o trabalho de Iñarritu nunca foi algo caracterizado pela harmonia ou pela minha admiração dos seus esforços. Apesar da explosiva genialidade e vitalidade de Amores Perros, um dos filmes que mais culpo pela odiosa moda do filme mosaico que assolou a primeira década do presente século, o realizador depressa se provou como o mestre do mais sufocante miserabilismo e juvenil misantropia no panorama do cinema internacional. Que os seus filmes pareciam estar sempre em busca do mais prosaico tipo de aceitação e respeitabilidade de Hollywood certamente não ajudou a que a minha consideração por este autor fosse particularmente positiva.




Mas, depois de Biutiful, um filme tão focado no sofrimento abjeto da sua personagem principal que quase caía no mais hilariante e inapropriado tipo de comédia acidental, houve um fugaz raio de luz sob a forma de Birdman. Já neste blog falei da obra que valeu a Iñarritu um Óscar para Melhor Realizador, um filme que está longe de ser perfeito ou minimamente inovador ou mesmo completamente funcional nas suas ideias formais, mas que, mesmo assim, primou por uma energética leveza e refrescante jovialidade. É triste ter de admitir isto, mas Iñarritu não aprendeu nada com Birdman e em The Revenant regrediu e voltou ao seu habitual miserabilismo, que desta vez quase que chega ao ponto de ser um exemplo de torture porn coberto pela detestável pátina da respeitabilidade mainstream.

Quando o primeiro trailer, o teaser, para The Revenant foi revelado, eu tenho que confessar que ainda tive esperança do realizador ter transportado a energia cinemática, e um pouco desajeitada, de Birdman e a tivesse aplicado a um drama mais ao estilo dos seus usuais estudos de miséria humana. Basicamente, a formidável concretização técnica sugerida por esse teaser parecia indicar uma maturação no cinema de Iñarritu, a abertura de uma nova fase no seu cansativo discurso artístico. No final, no entanto, parece que a única coisa que esse teaser realmente demonstrou na sua totalidade é quão reacionário o filme é como objeto final, devendo praticamente todo o seu estilo ao trabalho de génios do meio, cuja grandeza Iñarritu poderá tentar imitar, mas cuja mestria ele nunca conseguirá igualar.




Werner Herzog e Terrence Malick são os realizadores cuja influência mais é difícil de ignorar, o que no caso do mestre texano é particularmente impossível. Todo o visual do filme, na verdade, é quase que uma reciclagem direta do trabalho de Malick durante a sua última década de trabalho, sendo que Iñarritu emprega o trabalho de Emmanuel Lubezki, o diretor de fotografia de eleição de Malick, de tal modo que, longe de encontrar uma estética mais ou menos característica do projeto como objeto independente, praticamente copia o mesmo tipo de abordagem naturalista e focada na utilização de fontes de luz naturais que caracteriza a magistral relação artística entre o genial diretor de fotografia mexicano e o génio americano. Para além disso, Iñarritu também escolheu como seu cenógrafo e figurinista, Jack Fisk e Jacqueline West que, neste momento, são indiscutíveis regulares da filmografia de Malick. O look de O Novo Mundo parece ter sido uma particular influência, com a solarenga vitalidade desse filme a ser aqui substituída por uma horrenda frieza e desumana polidez.

Aliás, é precisamente nessa polidez, própria do cinema de prestígio de Hollywood, que se encontram os maiores triunfos e algumas das maiores fragilidades de The Revenant. A execução técnica conseguida pela formidável equipa por detrás deste filme é simplesmente espetacular. A fotografia de Lubezki leva a sua câmara a mover-se em baléticos movimentos através do espaço natural com uma precisão completamente deslocada da selvajaria dos seus sujeitos. A concretização física do mundo da narrativa é assombrosa na sua fidelidade histórica e reprodução de rudes texturas, criando uma superfície de admirável ultranaturalismo. Mas é o som que se revela como o mais grandiosos elemento, inundando a paisagem sonora com uma colossal densidade de pequenos sons que juntos compõe um retrato de um esmagador mundo natural que tudo envolve, afogando os elementos humanos na sua sonoridade que é complementada por uma banda-sonora em que o ruído desabrocha no espectro de sofredoras peças musicais onde a elegância melódica é posta de parte em prol da máxima violência sensorial e emocional.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Oscar Hopefuls, Taylor Sheridan por SICARIO




Sicario foi o primeiro filme com guião escrito por Taylor Sheridan, um ator que apenas recentemente se parece ter dedicado à escrita. Para uma estreia como argumentista, há que louvar a complexidade moral e ética que o seu texto consegue conjurar, ou pelo menos que o Denis Villeneuve consegue retirar do texto.

Essa, aliás, foi uma dúvida que mantive comigo desde que vi o filme, se o trabalho de Sheridan merece admiração ou se foi apenas o trabalho do realizador que possibilitou a emergência de surpreendentes complexidades e problemáticas na narrativa de Sicario e seu estudo de personagem. No final, decidi que, mesmo que as intenções de Sheridan estejam bastante distantes dos aspetos que eu mais aprecio no filme, o seu trabalho merecia louvor por possibilitar a construção de um dos melhores filmes do ano.




Em Sicario, seguimos a personagem de Kate Macer, interpretada por Emily Blunt no melhor trabalho da sua carreira, uma agente do FBI que se vê integrada numa equipa da CIA envolvida na guerra às drogas focada na luta contra os cartéis mexicanos. Com ela vamos descobrindo a sufocante teia de secretismos que formam a abordagem americana ao poder e influência dos cartéis, sendo que vamos também observando o machismo intrínseco a todas as interações dos membros da equipa para com Kate, nomeadamente o odioso, mas nojentamente descontraído, Matt Gaver (Josh Brolin) e o misterioso Alejandro Gillick (Benicio del Toro).

À medida que a narrativa se desenvolve, Kate vai constantemente investindo contra as obscuras forças de autoridade masculinas, tentando perceber o que realmente se está a passar no amoral mundo da luta contra os impérios das drogas, sendo que vai descobrindo, aos poucos os horrores desse mundo, assim como os horrores das ações americanas e o modo como tem sido manipulada durante toda a narrativa.




Em relação ao tratamento da sua protagonista, o guião de Sheridan lembra fortemente O Silêncio dos Inocentes, cuja protagonista, Claice Starling, é igualmente uma agente num mundo de domínio masculino, cujo maior adversário, mais ainda do que os monstros criminosos que sobre ela se abatem parece ser a sufocante patriarquia de todo o sistema em que se encontra. É claro que há algo a fortemente separar as duas personagens, Starling á uma heroína proactiva, enquanto Kate é um veículo da audiência, e longe de ser heroica e ativa ela funciona como uma testemunha aterrorizada de todos os horrores do filme que não se estendem somente à violência dos cartéis.

Parte do génio de todo o texto, devém do modo como encara as personagens da patriarquia que rodeiam Kate, nunca as julgando abertamente, mas deixando espaço à audiência para ver a negrura que se esconde por detrás do seu bravado, ativamente subvertendo as expectativas de uma audiência quando confrontada com o que é efetivamente um thriller de ação. Isto torna-se particularmente evidente quando o filme se torna numa narrativa de vingança a partir do momento em que abandona a perspetiva de Kate e se dedica a observar o sanguinário plano de Alejandro, o assassino titular.




Textualmente, há pouco de complexo ou verdadeiramente subversivo nesta porção do filme, mas a execução de Denis Villeneuve e todo a narrativa que a antecedem, levam a que esta clássica história de vingança, esta popular imagem do anti-herói contemporâneo, se revelem como tenebrosas expressões de amoralidade, aqui aprovada pelas forças americanas, que, na criação das suas demoníacas narrativas, são tão culpados da infernal situação do México como os cartéis. Sicario revela-se assim como uma surpreendente examinação de narrativas a que estamos perigosamente acostumados e que raramente questionamos, estando sempre na inocente presunção que sabemos distinguir heróis de vilões.


Toda esta brilhante subversão de narrativas populares no panorama atual do cinema americano podem ser inadvertidamente indicadas pelo texto de Sheridan, mas, independentemente, das suas intenções, volto a salientar quão brilhante é o resultado final. No panorama atual da Awards Season, uma nomeação para Melhor Argumento Original é uma possibilidade, especialmente depois do sucesso do filme entre os sindicatos de Hollywood, mas outros filmes, escritos por nomes bastante mais sonantes que o de Taylor Sheridan, poderão roubar o lugar a este merecedor, complicado e desafiador trabalho.



terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Oscar Hopefuls, Colin Gibson e Lisa Thompson por MAD MAX: FURY ROAD




Tradicionalmente, os Óscares reconhecem cenografias opulentas, belas, minuciosamente detalhadas e ricas em monumentais interiores. O trabalho de Colin Gibson e Lisa Thompson é certamente grandioso mas a sua glória não se encontra na criação de luxuosos interiores mas sim no exército de apocalípticas viaturas que formam a perseguição enlouquecida que marca todo o filme de George Miller.




A War Rig em que os protagonistas viajam durante praticamente todo o filme é certamente o mais icónico desses veículos, sendo que, com as suas variadas partes, o camião tornado máquina de guerra contém em si a riqueza de informação visual e complexidade dos melhores cenários que este ano estão na provável mira dos Óscares. Alguns dos melhores momentos de Mad Max, aliás, consistem na intrépida passagem das personagens pelas várias áreas da War Rig quando esta se encontra em movimenta. Quando isto é feito durante o momento de sanguinária batalha, o efeito é ainda mais espetacular.




De destacar na War Rig está o interior da zona do condutor, onde todas as superfícies se encontram cobertas com algum tipo de detalhe decorativo. Num mundo tão miserável como aquele presente em Mad Max: Estrada da Fúria é curioso vermos a necessidade da humanidade por beleza, por algum semblante de conforto visual. É claro que a estética aqui presente é bastante diferente do que usualmente consideraríamos elegante, mas é inegavelmente impressionante. Quem diria que uma das melhores maneiras de concretizar uma sociedade miserável, no meio de um deserto pós-apocalíptico, seria a partir de um gosto quase barroco pelo detalhe?




As restantes viaturas desta perseguição seguem a mesma lógica de loucura barroquista aplicada a imagens de mortífera agressividade. Como Monster Trucks desenhadas por Bernini para uma cultura de constante guerra, todos os veículos são verdadeiras obras-de-arte sobre rodas, rasgando a beleza simples e monumental dos exteriores desérticos com complicadas silhuetas, cheias de sinuosos apêndices, como as lanças que balançam com cada movimento errático destas construções.






Para mim, a melhor das viaturas é, sem dúvida, aquela cuja função no campo de batalha é uma obra de pura genialidade mais perto da pop art que do usual cinema de ação. Falo, pois claro, da viatura que transporta o guitarrista que trabalha para Imortan Joe como acompanhante musical da carnificina. A sua guitarra que cospe fogo foi criada a partir de uma arrastadeira, e é completamente funcional, servindo como o melhor adereço em todo o cinema de 2015, e como fundo, este músico do inferno tem uma louca construção de altifalantes todos precariamente amontoados na viatura. Uma obra de puro génio.






Esta equipa de cenógrafo e decoradora basearam esta estética, tanto no passado da saga Mad Max, onde tais gostos pela exuberância distópica do futuro já estava presente, como em numerosas outras referências, tanto do cinema como do mundo dos romances gráficos. Um carro coberto de ameaçadores espinhos metálicos é um destes melhores exemplos, sendo baseado em semelhante viatura de um antigo filme de Peter Weir, um dos grandes mestres do cinema australiano, tal como George Miller.




Gibson não é nenhum estreante neste mundo de filmes focados em cenários motorizados, sendo que também foi responsável, entre numerosos filmes, por As Aventuras de Priscilla; A Rainha do Deserto, em que um trio de exuberantes drag queens australianos viajam pelo deserto da Austrália numa bizarra road trip. Escusado será dizer que Colin Gibson é, neste momento, uma verdadeira instituição viva do cinema australiano.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Oscar Hopefuls, Sandy Powell por CINDERELA




Sandy Powell é uma lenda viva, um génio absoluto do desenho de figurinos. Mesmo quando o seu trabalho deixa um pouco a desejar como em The Other Boleyn Girl, há sempre algo de interessante nas suas criações, nem que seja o seu primoroso uso de tecidos, cores e padrões. Este ano, a figurinista britânica poderá ser nomeada por dois filmes, algo que já lhe aconteceu em 1998, quando foi nomeada por Shakespeare in Love e Velvet Goldmine. Os filmes de que falo neste caso são Carol, mais uma das gloriosas colaborações desta figurinista com Todd Haynes, e talvez o seu mais opulente e dispendioso trabalho até à data, a nova versão de Cinderela da Disney.





Powell começou a sua carreira nos palcos ingleses, sendo que a sua primeira aventura pelo mundo do cinema veio com Caravaggio de Derek Jarman. Durante os anos que se seguiram a esse filme de 1986, Powell continuou a trabalhar maioritariamente com esse visionário do cinema avant-garde inglês. Infelizmente, Jarman morreu em 1994, sendo que o seu último filme, Blue nem sequer precisou do trabalho de uma figurinista, sendo que era composto por apenas som sobre um ecrã em azul. Entretanto, Powell havia começado a trabalhar com outros autores, mas sempre num registo bastante mais ousado e artístico do que seria de esperar para uma artista com tão grande gosto por visões de ensandecida opulência.




A sua primeira nomeação para os Óscares veio com o seu trabalho em Orlando, uma adaptação do complicado clássico de Virginia Woolf. O filme de Sally Potter tem uma narrativa que se estende por vários séculos, permitindo a Powell uma maravilhosa criação de diversos visuais estilizados que vão desde uma visão exuberante e enlutada do período isabelino tardio até à contemporaneidade. Não foi esta no entanto, a grande entrada de Powell em Hollywood e no mundo dos grandes estúdios, tal coisa apenas aconteceu com Entrevista com um Vampiro, outra narrativa que engloba diversos períodos devido à imortalidade dos seus protagonistas. A partir daí, a filmografia de Powell tem sido um encadeamento de filmes que, mesmo quando não são grandes obras de cinema, têm sempre fascinantes e maravilhosos figurinos. Desde a morte de Jarman, dois autores têm mantido uma colaboração muito próxima com Powell, Todd Haynes e Martin Scorsese.




Como já disse, é provável que Sandy Powell oiça o seu nome por duas vezes no anúncio das nomeações aos Óscares, mas não estamos aqui para falar do romance de Todd Haynes, mas sim da fantasia realizada por Kenneth Branagh.

domingo, 10 de janeiro de 2016

Oscar Hopefuls, Michael Shannon em 99 HOMES


Michael Shannon 99 Homes


Em 99 Casas, Michael Shannon interpreta o Mefistófeles do pacto faustiano a que a personagem de Andrew Garfield se submete, em busca de algum semblante de segurança económica para si e a sua família depois de se ver despejado da casa onde tinha crescido. Shannon é Rick Carter um empresário do mundo da imobiliária que é um dos grandes responsáveis pelo despejo da família central à narrativa do filme de Ramin Bahrani.

O cinema americano não é muito apegado ao realismo social pelo que 99 Casas, independentemente de algumas das suas fragilidades e lugares comuns, é uma estranha preciosidade no panorama do cinema independente americano, mostrando uma realidade que parece amedrontar muitos dos seus mais ousados autores. Mas não estou aqui para explorar a qualidade deste filme, mas sim para examinar o trabalho do ator responsável pelo seu principal antagonista, que é tão relevante e prevalente em toda a narrativa que quase se poderia categorizar como um coprotagonista, juntamente com o Dennis Nash de Andrew Garfield.


Michael Shannon 99 Homes


Shannon não é um ator particularmente célebre pela sua modéstia e subtileza, sendo que, mesmo nos mais sóbrios filmes, o ator tem uma infeliz tendência para exagerar o seu trabalho de tal maneira que sufoca os seus filmes e rouba o holofote a quaisquer outros atores que tenham a infelicidade de com ele partilhar uma cena. Isto, por vezes, resulta de modo formidável, especialmente quando o ator tem a oportunidade de explodir em turbilhões de energia neurótica numa posição de protagonismo como acontece em Take Shelter. 99 Casas é, por isso, uma louvável anomalia na filmografia do ator, ou, melhor dizendo, é uma surpreendente e eficaz modulação dos seus mais característicos impulsos e manias em prol da narrativa do filme.

Assim que vemos Rick Carter, percebemos que este é um indivíduo que transpira veneno e malícia e é aqui que o talento do ator em pintar as suas personagens com grossas e intensas pinceladas começa a se mostrar. Não há grande nuance na vil presença de Carter, mas é difícil não se ficar fascinado pela sua personagem, mesmo quando ele parece ser uma personificação de todo o vil e desumano oportunismo que tem caracterizado tantas histórias semelhantes à deste filme, em que magnatas impõem o seu poder e vão despreocupadamente arruinando as vidas daqueles menos financeiramente estáveis que eles mesmos.


Michael Shannon 99 Homes


Mas este não seria um conto faustiano sem um certo elemento de sedução e rapidamente Rick Carter torna-se no patrão de Dennis e começa a conduzi-lo por um caminho de crescente e implacável ganância. Não é que o retrato de Shannon se torne notoriamente mais aliciante, mas há algo de potentemente credível na sua prestação que nunca permite que Carter se torne num cartoon, ao estilo do vilão que Shannon interpretou em Man of Steel. No final, é o dinheiro em si e não o carisma de Carter que levam a que Dennis assine o seu pacto com o diabo e, ao nunca tentar atenuar a fealdade psicológica da sua personagem, Shannon ajuda a dar uma refrescante complexidade ao filme. Paradoxalmente, ao evitar a nuance e a subtileza, Shannon ajuda a complicar a narrativa de 99 Casas.

Alguns dos melhores momentos de Michael Shannon provêm das cenas em que Carter se encontra em contextos que não o permitem ser a constante figura de autoridade vilanesca que tanto o caracteriza. Falo de momentos como a festa que este dá em sua casa, e em que, por uma única instância, Shannon parece demonstrar alguma variação no seu retrato, que mesclada com o conteúdo repugnante das suas palavras, apenas serve para exacerbar a vil interioridade de Carter. Também quando, durante o final, Carter é confrontado com uma crise imprevista nos seus planos, Shannon é exímio tanto no seu pânico como na untuosidade da sua manipulação e grotesca desculpabilização.




Michael Shannon oferece em 99 Casas uma formidável prestação de uma víbora das narrativas económicas contemporâneas, que é mais assustadora pela sua abjeta falta de subtileza a esconder a sua malícia e pela desumana casualidade com que vai arruinando as vidas de terceiros. Depois de uma série de inesperadas nomeações para prémios tão importantes como o SAG e o Globo de Ouro, parece que Shannon está no bom caminho para alcançar a segunda nomeação da sua carreira, de novo na categoria de Melhor Ator Secundário. Se tal acontecer, será uma indicação bem merecida, se bem que isso ainda não é uma certeza devido à grande instabilidade que tem vindo a caracterizar esta Awards Season. De momento, eu diria mesmo que o único ator que está completamente seguro nesta categoria é Mark Rylance, mas nunca se sabe.





Oscar Hopefuls, Jennifer Lawrence em JOY


Jennifer Lawrence


Depois de duas nomeações e um Óscar, imensamente pouco merecido, parece que Jennifer Lawrence está no caminho de mais uma indicação ao prémio mais prestigioso da Hollywood atual pelo seu trabalho num filme da autoria de David O. Russell. O realizador americano, que fez parte da enchente novas vozes autorais a se manifestarem inicialmente nos anos 90 durante o auge do cinema independente, foi responsável por dirigir a atriz por já três vezes, sendo que pela sua primeira colaboração, a atriz venceu o Óscar.

Desde 2012, quando Jennifer Lawrence chegou ao estrelato absoluto e arrecadou o galardão para Melhor Atriz num Papel Principal pela sua prestação em Silver Linings Playbook, que eu tenho nutrido uma grande antipatia pela atriz. Durante alguns anos, desejei que a atriz que tanto potencial e vulnerabilidade tinha mostrado em Winter’s Bone conseguisse afirmar-se no mundo do cinema, e tal começou finalmente a acontecer com a sua participação nos filmes do X-Men, onde infelizmente o trabalho de Lawrence não foi, de modo algum, impressionante. Finalmente, com o primeiro filme da saga The Hunger Games parecia que todo o mundo tinha acordado para o potencial da jovem intérprete americana, mas nesse mesmo ano veio o filme de David O. Russell, e a minha admiração pela atriz foi extinta com a mesma facilidade que a frágil e insegura chama de uma vela.


Jennifer Lawrence


Nesse filme, o mundo teve o primeiro vislumbre de Lawrence e o seu luminoso carisma de estrela sob a orientação do indisciplinado David O. Russell, cuja abordagem a dirigir atores parece ser juntar o máximo de atores com estilos completamente diferentes, não lhes dar quaisquer limitações, e ver a tempestade de improvisação e maneirismos que daí aparece. Como uma viúva a sofrer de uma debilitante depressão, a jovem Jennifer Lawrence decerto que brilhou com o mesmo tipo de presença que caracterizou muitas das mais adoradas estrelas das comédias da era dourada dos estúdios de Hollywood, mas para além disso, a atriz teve pouco para oferecer, revelando-se como uma intérprete imensamente imatura e incapaz de revelar a complicada interioridade que o texto exige que a sua personagem possua. Basicamente, Lawrence tornou a sua Tiffany numa incontornável Manic Pixie Dreamgirl, e, para minha grande surpresa e horror, conseguiu revelar tal atrocidade de redutivismo e erróneo simplismo até ao palco do Dolby Theatre, onde arrecadou o Óscar que deveria ter sido entregue a Emmanuelle Riva.

Apesar de tal catástrofe, eu ainda tinha esperanças que a atriz se conseguisse redimir, especialmente quando American Hustle começou a ser falado como um formidável showcase para a atriz ao estilo dos mais ensandecidos caper films do cinema de entretenimento do passado. Quando finalmente vi American Hustle não foi sucesso o que eu encontrei, mas sim a atriz a interpretar novamente uma personagem demasiado velha para si e portadora de uma complexidade que nunca é percetível pelo trabalho caricaturado da atriz. Sinceramente, eu penso que isto é grande culpa de O. Russell e não da atriz, mas isso não altera o facto de que apenas numa cena partilhada com Jack Huston é que eu tive um vislumbre do génio que tantos pareciam estar a ver no trabalho de Lawrence. Amy Adams e Bradley Cooper são perfeitos contraexemplos para o trabalho de Lawrence, sendo que os dois atores apresentam trabalhos imensamente estilizados e exagerados ao estilo da nova musa de O. Russell, mas ambos têm a mestria de injetar uma boa dose de desespero e latente humanidade nos seus retratos, algo que Lawrence parece ser incapaz de fazer.


Jennifer Lawrence


Depois de todas estas palavras sobre o trabalho de Jennifer Lawrence e David O. Russell escusado será dizer que eu não tinha grandes expectativas de encontrar qualquer vislumbre de qualidade na mais recente colaboração dos dois. No entanto, tenho de dizer que Joy me surpreendeu pela positiva.

De modo geral, o filme é um indisciplinado melodrama, que, apesar de tudo, consegue encontrar momentos de delicada e inesperada melancolia, tornando-se numa obra catastroficamente problemática que no entanto consegue ser uma boa peça de entretenimento com algumas complexidades agradáveis. Depois de dois filmes em que Lawrence tinha de partilhar o holofote com uma coleção de outros atores com semelhante ou superior importância dramatúrgica, O. Russell concebe Joy como o derradeiro star vehicle para Jennifer Lawrence e, de modo geral, parece-me que finalmente a atriz e o realizador conseguiram produzir algo de mérito entre os seus esforços.


Jennifer Lawrence


Lawrence interpreta a personagem titular, Joy Mangano, uma mãe divorciada em 1989, que, seguindo os seus sonhos de infância, decide tornar-se numa inventora e acaba por conceber a Miracle Mop, um produto de limpezas que, com muito esforço seu e da sua família, acabou por a catapultar para uma vida de sucesso comercial. Mas, ao contrário do que seria de esperar, o filme de David O. Russell é estranhamente desinteressado no sucesso da sua protagonista, passando a grande maioria da sua duração a examinar e explorar as lutas e os fracassos que se interpuseram entre esta empreendedora americana e o seu sonhador triunfo. Ou seja, é um clássico melodrama de intenções inspiradoras sobre um underdog que se consegue afirmar apesar de todo o mundo estar contra si.

Quando o filme começa, pessoas que tenham visto as passadas obras do seu realizador irão imediatamente assumir que esta é outra obra de energética indisciplina cheia de jovial cacofonia. Isto é parcialmente correto, pelo menos em relação à primeira metade do filme. Durante estes primeiros momentos, Lawrence mostra novamente a sua presença de estrela a ser empregue a um papel imensamente mais maturo que a atriz parece apta para interpretar. Mesmo assim, o carisma natural de Lawrence consegue aguentar bem os mais problemáticos momentos da narrativa, mostrando algo daquele desespero nervoso que tanto enriqueceu o trabalho de Amy Adams e Bradley Cooper no anterior filme de David O. Russell. Joy Mangano pode ser uma formidável e resiliente personificação da impetuosidade americana, mas há um constante desespero e melancolia a informarem as escolhas da atriz, que mesmo nos seus momentos de sucesso parece transmitir um invariável cansaço.


Jennifer Lawrence


O ponto de viragem, tanto na qualidade do filme como no trabalho da atriz vem aquando da participação de Joy no programa de televendas da QVC, tentando vender o fruto do seu trabalho em direto. É aqui que a atriz demonstra uma formidável mestria sobre a sua personagem e sobre as necessidades do filme. Lawrence é uma estrela de cinema, disso não há dúvida, mas curiosamente um dos seus melhores atributos enquanto intérprete devém precisamente da sua negação dessa mesma natureza de estrela como ela fez com a nervosa Katniss Everdeen nos primeiros dois filmes da saga Hunger Games. Ver Lawrence interpretar o colossal desconforto de Joy Mangano em frente a câmaras pela primeira vez na vida é uma delícia incalculável e uma perfeita exposição dos talentos da atriz que, nesta sequência torna Joy numa heroína fortemente humana e arrebatadoramente vulnerável apesar da sua força e imbatível vontade de vencer neste mundo.

Esse é o píncaro do trabalho da atriz, mas durante a maior parte do restante filme, Jennifer Lawrence mantém o mesmo sólido nível de qualidade, com apenas alguns momentos a mostrarem algumas das fragilidades tanto do papel como do filme. Falo mais especificamente das cenas em que Lawrence precisa de demonstrar algum tipo de poder autoritário, com especial destaque para uma espécie de epílogo que a encontra como uma consumada mulher de negócios. Aqui, a relativa imaturidade da atriz volta a desferir um forte golpe sobre o seu trabalho, revelando como uma atriz de uma idade mais avançada ou com uma presença que não seja tão dependente da sua jubilante juventude poderia ser uma melhor escolha para o papel.


Jennifer Lawrence

De momento, uma nomeação não parece ser uma certeza, mas veremos o que vai acontecer. Apenas Saoirse Ronan por Brooklyn, Brie Larson em Room e Cate Blanchett em Carol parecem ter assegurado a sua presença entre os nomeados, mas, se a História se for repetir, Lawrence pode estar segura de ir receber mais uma nomeação pela sua colaboração com O. Russell. Eu, pessoalmente, nunca a escolheria como uma das cinco melhores prestações por uma atriz principal em 2015, mas fico entristecido ao pensar que Lawrence terá a infeliz distinção de ser nomeada e galardoada por alguns dos seus piores trabalhos quando algumas das suas interpretações infinitamente superiores são ignoradas. Enfim, podemos sempre lembrar-nos da sua primeira nomeação por Winter’s Bone.



sábado, 9 de janeiro de 2016

FYC, Cate Blanchett em CINDERELLA


Cate Blanchett Cinderela


2015 tem sido um ano explosivo para Cate Blanchett. Logo em janeiro, Cavaleiro de Copas estreou no festival de Berlim, marcando a primeira colaboração entre a atriz australiana e um dos mais importantes autores do cinema contemporâneo. Em outubro, os eruditos dos Óscares apenas pareciam ter uma dúvida em relação à grandiosidade de Blanchett e era sobre que interpretação iria cair a graça da academia? O drama factual e politicamente incendiário Truth, ou o apaixonante romance Carol? Entretanto essa questão foi respondida, e o seu trabalho no filme de Todd Haynes parece ter garantido a presença da atriz nas nomeadas deste ano. Junte-se a esta enchente de formidáveis filmes, a recente coroação de Blanchett como a Melhor Atriz de 2013, e parece que a atriz se está a tornar numa força imparável ao estilo de Meryl Streep. Apesar de todo este prestígio autoral e prestigioso, não é sobre nenhum dos filmes anteriormente referidos que aqui quero falar, mas sim sobre Cinderella.

Comparado com os seus papéis em Cavaleiro de Copas, Truth e Carol, o seu trabalho como Lady Tremine, a maldosa madrasta de Cinderella poderá parecer algo menor, ou esquecível, mas, pessoalmente, penso que é uma incontornável injustiça que Cate Blanchett esteja completamente excluída da conversa para o Óscar de Melhor Atriz Secundária. Poucas vezes a atriz foi tão deliciosamente estilizada e paradoxalmente humana, sem nunca deixar o seu trabalho ofuscar de modo prejudicial o filme em que se encontra. De todos os trabalhos da atriz, junta-se talvez a O Talentoso Mr. Ripley, como uma perfeita junção de técnica, carisma, estilo, artifício, sinceridade e puro divertimento na filmografia da atriz.


Cate Blanchett Cinderela


Seria erróneo falar de Cate Blanchett em Cinderella sem mencionar o trabalho de Sandy Powell (talvez chegue a fazer um post sobre os figurinos). Vestida com os seus esplendorosos figurinos, a atriz torna-se uma versão da madrasta apimentada com um glamour da Hollywood passada. A sua silhueta e pose são as de Joan Crawford no seu mais ensandecido e elegante registo, como seria apropriado para a sua imagem concebida por Powell, e os seus movimentos acompanham a estilização sugerida pelos figurinos. Estamos num ambiente de conto de fadas, onde a lógica visual parece seguir regras de filmes de animação, sendo que a atriz, ao invés de lutar contra estes exageros e simplicismos, trabalha com eles e cria uma construção final consistente e deliciosa na sua malvadez de cartoon.

Basta olhar-se para a sequência do baile para reparar na estilização exuberante no trabalho de Blanchett, que parece uma extensão humana da opulência visual que a rodeia. Também aqui é impossível ignorar os talentos cómicos da atriz, que poucas vezes teve a oportunidade de trabalhar num registo tão exageradamente expressivo. Mas, apesar de todos estes floreados elogios, Blanchett nunca se deixa tornar num inofensivo e distante cartoon de ridícula vilania.




Lady Tremine entra no filme de Kenneth Branagh como uma viúva glamourosa, e, como  a narradora indica, ela veste muito bem a sua perda. O mesmo se pode dizer de Blanchett que veste a dolorosa humanidade da sua personagem como mais uma das suas elegantes indumentárias. A acompanhar e complementar a estilização, há sempre a sombra de uma mulher que amava o primeiro marido e se encontrou a casar com um homem que a coloca permanentemente na sombra tanto da sua falecida primeira esposa como da sua filha. Há um amargo ressentimento no olhar de Tremine, uma sugestão de vulnerabilidade disfarçada pelo veneno maldoso dos seus atos.

Apesar de estilizada, a madrasta de Ella é palpavelmente humana ao mesmo tempo que é uma vilã digna de cartoon, o que a faz imensamente mais perigosa que se simplesmente fosse unicamente uma caricatura distante. Tudo isso é perfeitamente visível na grande confrontação entre a vilã e a protagonista no sótão de sua casa, onde a vilania de Tremine é oferecida em toda a sua grandiosa mesquinhez e perigosa humanidade. Não vilão mais assustador que aquele que conseguimos imaginar no nosso mundo, e Blanchett cria o equilíbrio perfeito entre a fantasia e o lado mais humano do filme e da sua personagem.





Infelizmente para esta estrela australiana, as associações de prémios poucas vezes têm paciência para interpretações deste tipo em filmes tão leves e abertamente juvenis como Cinderella. Talvez se Blanchett fosse um homem e tivesse uma narrativa meio sofredora (Johnny Depp em 2003) esta interpretação ganhasse algum reconhecimento na Awards Season. Como tal não acontece, acho que não vale a pena ter grandes esperanças. Mesmo assim, há que celebrar este trabalho, e recordar a Lady Tremine de Cate Blanchett como uma das mais formidáveis presenças que agraciaram os ecrãs de cinema em 2015. Viva a magnífica Cate!