domingo, 10 de janeiro de 2016

Oscar Hopefuls, Jennifer Lawrence em JOY


Jennifer Lawrence


Depois de duas nomeações e um Óscar, imensamente pouco merecido, parece que Jennifer Lawrence está no caminho de mais uma indicação ao prémio mais prestigioso da Hollywood atual pelo seu trabalho num filme da autoria de David O. Russell. O realizador americano, que fez parte da enchente novas vozes autorais a se manifestarem inicialmente nos anos 90 durante o auge do cinema independente, foi responsável por dirigir a atriz por já três vezes, sendo que pela sua primeira colaboração, a atriz venceu o Óscar.

Desde 2012, quando Jennifer Lawrence chegou ao estrelato absoluto e arrecadou o galardão para Melhor Atriz num Papel Principal pela sua prestação em Silver Linings Playbook, que eu tenho nutrido uma grande antipatia pela atriz. Durante alguns anos, desejei que a atriz que tanto potencial e vulnerabilidade tinha mostrado em Winter’s Bone conseguisse afirmar-se no mundo do cinema, e tal começou finalmente a acontecer com a sua participação nos filmes do X-Men, onde infelizmente o trabalho de Lawrence não foi, de modo algum, impressionante. Finalmente, com o primeiro filme da saga The Hunger Games parecia que todo o mundo tinha acordado para o potencial da jovem intérprete americana, mas nesse mesmo ano veio o filme de David O. Russell, e a minha admiração pela atriz foi extinta com a mesma facilidade que a frágil e insegura chama de uma vela.


Jennifer Lawrence


Nesse filme, o mundo teve o primeiro vislumbre de Lawrence e o seu luminoso carisma de estrela sob a orientação do indisciplinado David O. Russell, cuja abordagem a dirigir atores parece ser juntar o máximo de atores com estilos completamente diferentes, não lhes dar quaisquer limitações, e ver a tempestade de improvisação e maneirismos que daí aparece. Como uma viúva a sofrer de uma debilitante depressão, a jovem Jennifer Lawrence decerto que brilhou com o mesmo tipo de presença que caracterizou muitas das mais adoradas estrelas das comédias da era dourada dos estúdios de Hollywood, mas para além disso, a atriz teve pouco para oferecer, revelando-se como uma intérprete imensamente imatura e incapaz de revelar a complicada interioridade que o texto exige que a sua personagem possua. Basicamente, Lawrence tornou a sua Tiffany numa incontornável Manic Pixie Dreamgirl, e, para minha grande surpresa e horror, conseguiu revelar tal atrocidade de redutivismo e erróneo simplismo até ao palco do Dolby Theatre, onde arrecadou o Óscar que deveria ter sido entregue a Emmanuelle Riva.

Apesar de tal catástrofe, eu ainda tinha esperanças que a atriz se conseguisse redimir, especialmente quando American Hustle começou a ser falado como um formidável showcase para a atriz ao estilo dos mais ensandecidos caper films do cinema de entretenimento do passado. Quando finalmente vi American Hustle não foi sucesso o que eu encontrei, mas sim a atriz a interpretar novamente uma personagem demasiado velha para si e portadora de uma complexidade que nunca é percetível pelo trabalho caricaturado da atriz. Sinceramente, eu penso que isto é grande culpa de O. Russell e não da atriz, mas isso não altera o facto de que apenas numa cena partilhada com Jack Huston é que eu tive um vislumbre do génio que tantos pareciam estar a ver no trabalho de Lawrence. Amy Adams e Bradley Cooper são perfeitos contraexemplos para o trabalho de Lawrence, sendo que os dois atores apresentam trabalhos imensamente estilizados e exagerados ao estilo da nova musa de O. Russell, mas ambos têm a mestria de injetar uma boa dose de desespero e latente humanidade nos seus retratos, algo que Lawrence parece ser incapaz de fazer.


Jennifer Lawrence


Depois de todas estas palavras sobre o trabalho de Jennifer Lawrence e David O. Russell escusado será dizer que eu não tinha grandes expectativas de encontrar qualquer vislumbre de qualidade na mais recente colaboração dos dois. No entanto, tenho de dizer que Joy me surpreendeu pela positiva.

De modo geral, o filme é um indisciplinado melodrama, que, apesar de tudo, consegue encontrar momentos de delicada e inesperada melancolia, tornando-se numa obra catastroficamente problemática que no entanto consegue ser uma boa peça de entretenimento com algumas complexidades agradáveis. Depois de dois filmes em que Lawrence tinha de partilhar o holofote com uma coleção de outros atores com semelhante ou superior importância dramatúrgica, O. Russell concebe Joy como o derradeiro star vehicle para Jennifer Lawrence e, de modo geral, parece-me que finalmente a atriz e o realizador conseguiram produzir algo de mérito entre os seus esforços.


Jennifer Lawrence


Lawrence interpreta a personagem titular, Joy Mangano, uma mãe divorciada em 1989, que, seguindo os seus sonhos de infância, decide tornar-se numa inventora e acaba por conceber a Miracle Mop, um produto de limpezas que, com muito esforço seu e da sua família, acabou por a catapultar para uma vida de sucesso comercial. Mas, ao contrário do que seria de esperar, o filme de David O. Russell é estranhamente desinteressado no sucesso da sua protagonista, passando a grande maioria da sua duração a examinar e explorar as lutas e os fracassos que se interpuseram entre esta empreendedora americana e o seu sonhador triunfo. Ou seja, é um clássico melodrama de intenções inspiradoras sobre um underdog que se consegue afirmar apesar de todo o mundo estar contra si.

Quando o filme começa, pessoas que tenham visto as passadas obras do seu realizador irão imediatamente assumir que esta é outra obra de energética indisciplina cheia de jovial cacofonia. Isto é parcialmente correto, pelo menos em relação à primeira metade do filme. Durante estes primeiros momentos, Lawrence mostra novamente a sua presença de estrela a ser empregue a um papel imensamente mais maturo que a atriz parece apta para interpretar. Mesmo assim, o carisma natural de Lawrence consegue aguentar bem os mais problemáticos momentos da narrativa, mostrando algo daquele desespero nervoso que tanto enriqueceu o trabalho de Amy Adams e Bradley Cooper no anterior filme de David O. Russell. Joy Mangano pode ser uma formidável e resiliente personificação da impetuosidade americana, mas há um constante desespero e melancolia a informarem as escolhas da atriz, que mesmo nos seus momentos de sucesso parece transmitir um invariável cansaço.


Jennifer Lawrence


O ponto de viragem, tanto na qualidade do filme como no trabalho da atriz vem aquando da participação de Joy no programa de televendas da QVC, tentando vender o fruto do seu trabalho em direto. É aqui que a atriz demonstra uma formidável mestria sobre a sua personagem e sobre as necessidades do filme. Lawrence é uma estrela de cinema, disso não há dúvida, mas curiosamente um dos seus melhores atributos enquanto intérprete devém precisamente da sua negação dessa mesma natureza de estrela como ela fez com a nervosa Katniss Everdeen nos primeiros dois filmes da saga Hunger Games. Ver Lawrence interpretar o colossal desconforto de Joy Mangano em frente a câmaras pela primeira vez na vida é uma delícia incalculável e uma perfeita exposição dos talentos da atriz que, nesta sequência torna Joy numa heroína fortemente humana e arrebatadoramente vulnerável apesar da sua força e imbatível vontade de vencer neste mundo.

Esse é o píncaro do trabalho da atriz, mas durante a maior parte do restante filme, Jennifer Lawrence mantém o mesmo sólido nível de qualidade, com apenas alguns momentos a mostrarem algumas das fragilidades tanto do papel como do filme. Falo mais especificamente das cenas em que Lawrence precisa de demonstrar algum tipo de poder autoritário, com especial destaque para uma espécie de epílogo que a encontra como uma consumada mulher de negócios. Aqui, a relativa imaturidade da atriz volta a desferir um forte golpe sobre o seu trabalho, revelando como uma atriz de uma idade mais avançada ou com uma presença que não seja tão dependente da sua jubilante juventude poderia ser uma melhor escolha para o papel.


Jennifer Lawrence

De momento, uma nomeação não parece ser uma certeza, mas veremos o que vai acontecer. Apenas Saoirse Ronan por Brooklyn, Brie Larson em Room e Cate Blanchett em Carol parecem ter assegurado a sua presença entre os nomeados, mas, se a História se for repetir, Lawrence pode estar segura de ir receber mais uma nomeação pela sua colaboração com O. Russell. Eu, pessoalmente, nunca a escolheria como uma das cinco melhores prestações por uma atriz principal em 2015, mas fico entristecido ao pensar que Lawrence terá a infeliz distinção de ser nomeada e galardoada por alguns dos seus piores trabalhos quando algumas das suas interpretações infinitamente superiores são ignoradas. Enfim, podemos sempre lembrar-nos da sua primeira nomeação por Winter’s Bone.



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